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19/08/2013
Entrevista: Luiz Henrique do Amaral
Por uma agência autônoma de propriedade intelectual




Às vésperas de completar seu segundo mandato à frente da ABPI, o advogado Luiz Henrique do Amaral deixa um legado de realizações que tiveram como epicentro a inserção das empresas no mundo da Propriedade Intelectual. No Congresso deste ano, o quarto sob sua administração, o presidente da ABPI proporá a criação de uma agência de propriedade industrial autônoma, com a participação do setor privado. “O que defendemos é um INPI com gestão compartilhada com as empresas e com autonomia orçamentária”, adianta. “Um sistema de cogestão trará uma maior capacidade de resposta para os usuários do sistema de Propriedade Intelectual”.

ABPI: Por que o tema do Congresso deste ano é a Sociedade do Conhecimento e a Nova Economia?

Luiz Henrique do Amaral: A Sociedade de Conhecimento significa uma economia diferente de meramente produzir algo. O Brasil não pode pautar o seu desenvolvimento com produto conhecido, velho e barato. Tem que gerar conhecimento, tecnologia, inovação, é isso que move as grandes economias. E a Propriedade Intelectual é o que permite transformar a inovação em ativos, em negócios, em benefícios concretos para a economia, para os inventores e pesquisadores.

ABPI: O que os participantes podem esperar deste Congresso?

LHA: Os participantes, que estimamos em quase 1.000, uma quarta parte deles de outros países, vão travar contato com as tendências atuais na área de propriedade industrial e, em contrapartida, trazer as prioridades das empresas para discussão em foro de alto nível. Vão levar propostas concretas ou pelo menos o encaminhamento de propostas que atendam as preocupações do meio empresarial.

ABPI: E como será conduzida a discussão do marco regulatório?

LHA: Não vamos discutir a lei, mas a sua aplicação, como o judiciário está tratando isso, que iniciativas o governo está tomando em relação ao INPI. Ninguém aguenta mais a conversa sobre marco regulatório. O que se pretende é avançar no aprimoramento do sistema de Propriedade Intelectual.

ABPI: A ABPI vai propor durante o Congresso alguma questão específica neste sentido?

LHA: A ABPI vai levantar a bandeira da criação de uma Agência Nacional da Propriedade Intelectual autônoma, com participação do setor privado. Nossa proposta é de uma agência com autonomia orçamentária, capaz de aplicar os próprios recursos no desenvolvimento das suas atividades. Então seria um INPI mais moderno que utilizasse o dinheiro que arrecada no seu próprio aprimoramento, na melhoria das condições de trabalho, novas tecnologias, projetos. E com um tipo de gestão compartilhada com a iniciativa privada, através de um comitê gestor.

ABPI: O que seria preservado em relação ao INPI atual?

LHA: Tudo. O que muda é o status jurídico, que dará autonomia ao órgão. O INPI e toda a sua estrutura continuariam as mesmas, inclusive incorporando mais atribuições, como a área de direito de autor.

ABPI: O que, neste campo, a Agência de Propriedade Intelectual absorveria?

LHA: Hoje, o registro de software está no âmbito do INPI, mas estão fora as obras musicais, literárias, audiovisuais, arquitetônicas, científicas, que estão espalhadas em vários órgãos. Obra literária fica com a Biblioteca Nacional. Música com a Escola Nacional de Música. Arquitetura com a Escola de Desenho e Arquitetura. Obras visuais ficam com a Escola Nacional de Belas Artes. Tudo isso, ao invés de ficar espalhado, seria gerido por um único órgão de Propriedade Intelectual.

ABPI: Que outros benefícios essa mudança traria ao sistema de PI?

LHA: A cogestão com a iniciativa privada resultaria em uma capacidade maior de resposta para os usuários do sistema. Hoje, neste particular, o governo presta conta para o próprio governo, não há um canal direto e efetivo com inciativa privada. O processo é demorado por que ocorre no âmbito da esfera pública. Ora, o INPI fatura R$ 30 milhões a mais do que gasta por ano, mas não pode usar estes recursos. Com autonomia financeira poderia aplicar este dinheiro na melhoria do sistema.

ABPI: Que outros temas de relevância o Congresso deste ano vai debater?

LHA: Serão discutidos muitos assuntos que estão na ordem do dia, como a questão da titularidade do marketing de emboscada, os novos tratados internacionais, a proteção das obras jornalísticas no contexto digital, a legislação da biodiversidade, a integração dos escritórios de Propriedade Industrial da América do Sul.

ABPI: Qual a grande discussão hoje na área de tecnologia?

LHA: O Congresso discutirá temas que envolvem os contenciosos entre as empresas de telecomunicações e que definirão como vai funcionar a proteção dos sistemas de telefonia, do Ipad, Iphone, tablets e outras tecnologias que irão surgir. O que está ocorrendo é uma convergência para um único aparelho, por que, hoje, o que menos se faz no telefone é falar. Eu escrevo, mando arquivos, troco informação, pesquiso na internet, entro no meu computador. O contencioso é a inovação que cada fabricante incorpora no aparelho, que pode ser apenas um botão deslizante.

ABPI: A legislação atual de Propriedade Industrial é satisfatória para o desenvolvimento brasileiro?

LHA: Nossa legislação de Propriedade Industrial de um modo geral é boa, mas se acerta no atacado, muitas vezes erra no varejo. Precisa de alguns aperfeiçoamentos, como por exemplo, na área de patenteamento de seres vivos e material isolado da natureza. Na área de marcas talvez precise também de uma melhoria, mas não de uma mudança em todo marco regulatório. As mudanças, quando necessárias, têm que ser pontuais.

ABPI: E na indústria farmacêutica, o que precisa ser aperfeiçoado?

LHA: Na indústria farmacêutica a questão do momento é a anuência prévia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Infelizmente a ANVISA se recusa a cumprir com o parecer da Advocacia Geral da União (AGU), que mandou parar de examinar a patenteabilidade dos medicamentos.

ABPI: O que mudou no País, nestes quatro anos de sua gestão, no que se refere à Propriedade Intelectual?

LHA: Nesse período houve muita mudança, mas a principal foi cultural. Nas empresas, a Propriedade Intelectual, que era uma coisa muito distante, já está presente no dia-a-dia. Hoje há uma grande preocupação das empresas em proteger a inovação, que é um processo de realimentação constante. E a boa notícia é que empresas brasileiras, como Embraer e Embrapa, Natura, Boticário e Vale, para citar algumas, já estão tratando a Propriedade Intelectual como um mecanismo importante para o desenvolvimento das suas atividades. O Brasil mudou de patamar. Nós passamos a ser exportadores de Propriedade Intelectual.

Imagem: Ricardo Lopes